Definição e determinação da massa
A determinação da massa no ensino básico é apresentada como um conceito intrínseco ao corpo, mas mesmo esta definição não é trivial. Na definição mais genérica que encontramos em nossas pesquisas pela internet ou nos livros didáticos comumente utilizados no ensino básico encontramos que “massa é a quantidade de matéria presente a um corpo”. O problema desta definição é que não podemos medir diretamente essa “quantidade de matéria”. o Máximo que conseguimos é comparar um corpo com o outro, e desse modo precisamos de uma unidade padrão
Essa unidade padrão é o quilograma (kg, símbolo no sistema internacional de unidades) e é definido como sendo igual à massa do International Prototype Kilogram, IPK, (protótipo internacional do quilograma) que tem o peso quase igual a um litro de água. Esse protótipo é composto por irídio e platina e encontra-se sob custódia do Escritório Internacional de Pesos e Medidas em Serves, França, desde 1889, quando foi sancionado pela Conferencia Geral de Pesos e Medidas.(*)
Com a definição acima, podemos perceber que o valor atribuído à massa de um corpo apenas pode ser atribuído por comparação. Desse modo, podemos utilizar uma balança como instrumento de medida, mas ainda assim sua determinação não é trivial, pois hoje em dia existem diversos tipos de balança:
- Balança de Libra (Figrua 1). Essa balança funciona com a comparação de corpos, colocamos em um dos lados o corpo que queremos descobrir a massa e do outro vamos colocando corpos com massas conhecidas, até que a balança fique equilibrada. Deste modo, descobrimos a massa do corpo que queremos.
Figura 1 – Balança de Libra
- Balança de Molas (Figura 2). Essa balança de molas, que antigamente encontrávamos nas farmácias e outros locais, são compostas de molas que apóiam o piso da balança. Assim, quando um corpo é colocado em cima do piso, a interação gravitacional (“seu peso”) deforma a mola e essa deformação da mola indica qual a massa do corpo. A calibração da mola se dá a partir de massas conhecidas, de forma que conhecemos a deformação em função da força aplicada.
Figura 2 – Balança de mola
- Balança eletrônica (Figura 3). Funciona basicamente do mesmo modo da balança de molas. A diferença é que a presença do corpo é “sentida” por um chip eletrônico e a calibração deste chip é que determina a massa do corpo que queremos.
Figura 3 – Balança eletrônica
Com essas balanças, temos a definição operacional da massa de um objeto, a qual é bem entendida pelos alunos do ensino básico. Porém, quando apresentamos o conteúdo básico de Astronomia e Cosmologia no ensino básico, o conceito de massa é algo muito importante, mas a massa dos corpos não pode ser determinada por uma balança. Ainda que ela possa ser quantificada por comparação de uma unidade padrão, esta determinação não é trivial, afinal “no espaço não existe balança”.
Para isso, precisamos lançar mão de um arcabouço de teorias com suas fórmulas que pelas idéias bem estabelecidas desde Galileu Galilei, passando por Johannes Kepler e chegando a Isaac Newton, que sobrevive a uma primeira aproximação na escala astronômica que iremos considerar neste trabalho. Numa discussão mais aprofundada, deveríamos discutir o conceito de massa à luz da teoria da relatividade geral proposta por Albert Einstein, em 1915.
Medindo a massa de estruturas celestes com as Leis de Kepler
De maneira diferente do que é apresentado no ensino básico, as leis de Kepler não se restringem apenas ao sistema solar; elas são universais e se aplicam, com algumas modificações, a qualquer estrutura celeste. Entre outros exemplos, podemos citar os satélites, os planetas, as estrelas, os sistemas binários e até mesmos as galáxias.
A determinação da massa de uma estrela é um fato importante, pois conhecendo sua massa, juntamente com sua composição química, devemos ser capazes de calcular diversas outras propriedades destas estrelas, tais como raio, luminosidade, dentre outras. Com o modelo cosmológico atual e com nossa limitação da linguagem para o ensino básico, a massa de uma estrela pode ser obtida observando seus efeitos gravitacionais na presença de um segundo corpo em suas proximidades.
Desse modo, podemos medir a massa das estruturas celestes através da terceira lei de Kepler (modificada por Newton), relacionando o período orbital, o tamanho da órbita ou a velocidade de rotação com a massa de quaisquer dois objetos orbitando um ao redor do outro.
A seguir, iremos descrever brevemente as três leis de Kepler juntamente com a lei da gravitação universal de Newton, utilizando minimamente a matemática, mas tomando o devido cuidado de não omitir nenhuma informação que seja relevante para a discussão do texto.
As três leis de Kepler
Lei das órbitas elípticas ou a primeira lei de Kepler (1609): a órbita de cada planeta é uma elipse, com o Sol em um dos focos. Como conseqüência da órbita ser elíptica, a distância do Sol ao planeta varia ao longo de sua órbita.
Figura 4 – lei das órbitas.
Lei das áreas ou a segunda lei de
Kepler (1609): a reta unindo o planeta ao Sol varre áreas iguais em
tempos iguais. O significado físico dessa lei é que a velocidade orbital
não é uniforme, mas varia de forma regular: quanto mais distante o
planeta está do Sol, mais devagar ele se move. Dizendo de outra maneira,
essa lei estabelece que a velocidade areal é constante.
Para compreender a lei das áreas, observe a figura 5:
- O planeta percorre o arco P1P2 em um intervalo de tempo Δt1. O raio vetor que liga o planeta ao Sol varre a área A1.
- O planeta percorre o arco Q1Q2 em um intervalo de tempo Δt2. O raio vetor que liga o planeta ao Sol varre a área A2.
Figura 5 – lei das áreas
Assim, a expressão matemática para a segunda lei de Kepler é:
onde Vareolar é a quantidade de área varrida em um intervalo de tempo e é uma constante para cada planeta.
Em decorrência dessa lei, admite-se um movimento com velocidades diferentes ao longo da órbita (veja figura 6).
Figura 6 – movimento orbital
Lei dos períodos ou a terceira lei de
Kepler (1618): o quadrado do período orbital dos planetas e diretamente
proporcional ao cubo de sua distância média ao Sol. Essa lei estabelece
que planetas com orbitas maiores se movam mais lentamente em torno do
Sol e, portanto, isso implica que a força entre o Sol e o planeta
decresce com a distância ao Sol.
Sendo P o período sideral do planeta, a o semi-eixo maior da órbita, que é igual à distância média do planeta ao Sol, e K uma constante, podemos expressar a 3a lei como:
P2 = K.a3
Figura 7 – Posição de uma órbita no espaço
Figura retirada de Coelum Astrale – Ano III – N° 24 – setembro de 2012 – Irineu Gomes Varella
Apenas a aplicação das três leis de Kepler não é suficiente para determinar a massa de estruturas celestes, para isso precisamos promover uma modificação Newtoniana das leis de Kepler, aplicando a lei da gravitação Universal de Newton.
Lei da Gravitação universal de Newton
A descoberta da lei que nos mostra de que maneira os corpos celestes interagem, foi feita por Isaac Newton(**). Aplicando uma ferramenta matemática que ele havia recentemente desenvolvida, chamada “fluctions” e que hoje é conhecida como “cálculo diferencial”, à órbita da Lua em torno da Terra, Newton foi capaz de determinar que a força da gravidade depende do inverso do quadrado da distância entre a Terra e a Lua.
Newton enunciou que
“A força de atração gravitacional entre dois corpos de massas “M” e “m” é diretamente proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância que os separa.”
Para dois corpos de massas M e m, separados por uma distância r, a força gravitacional F que um exerce sobre o outro é dada por
onde G é uma constante denominada constante gravitacional universal e vale 6, 67 × 10−11 N.m2/kg2.
O grande triunfo de Newton foi conseguir
deduzir as três leis de Kepler fazendo uso da lei da gravitação e de
suas leis do movimento.
Terceira lei de kepler com modificação newtoniana
Vimos que Kepler mostrou empiricamente que sua terceira lei demonstra uma proporcionalidade entre a distância de um planeta em relação ao Sol e o seu período orbital. Por outro lado, Newton afirmara que existe uma força de atração gravitacional entre dois objetos massivos. Desse modo, poderíamos perguntar: será que estas duas formulações não poderiam ser combinadas? Para deixar a demonstração mais simples, sem perder o necessário rigor matemático, iremos impor algumas restrições.
- o planeta se move num círculo com velocidade v. Logo, a força resultante, que por um lado é a gravitacional, é a força centrípeta;
- a velocidade de rotação do planeta é constante. Logo, existe uma relação simples entre o período e a velocidade v (veja Figura 7).
Figura 7 – velocidade de rotação
- O sistema é isolado. Ou seja, os dois corpos de massas M e m orbitam em torno de um centro de massa (CM) em órbitas circulares de mesmo período. O corpo de massa M descreve um círculo de raio r1, enquanto o de massa m descreve um círculo de raio r2. O CM permanece em repouso, pois as únicas forças são as forças gravitacionais em cada um dos corpos, que constituem um par ação-reação.
Figura 8 – Dois corpos isolados orbitando em volta de um centro de massa.
A partir dessas considerações, pode-se mostrar que a soma das massas é proporcional à distância ao cubo e inversamente proporcional ao período ao quadrado:
A expressão acima permite a determinação da massa total do sistema, o que ainda nos deixa com o problema de “como determinar a massa de uma estrutura celeste”. Para resolver este problema, podemos fazer algumas considerações sobre os sistemas binários. Existem várias possíveis localizações do centro de massa de um sistema binário de estruturas celestes, dependendo das massas das estruturas que formam o par:
- uma das estruturas tem uma massa muitíssimo superior à da sua companheira. Um exemplo desta configuração são os sistemas planetários, onde planetas orbitam estrelas ou luas orbitam planetas.
Figura 9 – Centro de massa próximo ao centro da estrutura mais massiva.
Neste caso, o centro de
massa do sistema binário estará localizado dentro do corpo da estrela
maior, praticamente no seu centro, sobre a linha imaginária que une os
centros das estrelas. Podemos então dizer que, neste caso, uma estrela
gira em torno da outra. Isso é o que ocorre no nosso Sistema Solar, onde
o centro de massa está localizado muito próximo ao centro do próprio
Sol. A terceira lei enunciada por Kepler se aplica neste cenário.
- as duas estruturas possuem massas iguais. Neste caso, o centro de massa está exatamente na metade da distãncia que separa os dois objetos.
Figura 10 – Centro de massa equidistante.
- as duas estruturas possuem massas quase
iguais. Neste caso, o centro de massa estará localizado na linha
imaginária que une os centros das duas estrelas, fora do corpo de
qualquer uma delas, ligeiramente mais próximo da estrela que tiver a
maior massa.
Figura 11 – Centro de massa ligeiramente deslocado.
Nesse casos partículas, podemos obter M (primeiro caso) e m, desde que se conheça o período P e a distância a entre os objetos.